Pe.
Nelito Dornelas
Hoje é Domingo da Páscoa. È o dia em que
nós, os cristãos, renovamos nossa fé na ressurreição de Jesus. Com toda a
Igreja vamos proclamar: “Cristo
Ressuscitou dos mortos”, “Deus ressuscitou
a Jesus”, “Jesus está vivo”, Ele é
nosso Deus”, Eu creio na ressurreição e na vida eterna”.
Eu o convido a refletir sobre a Páscoa a
partir da narração do evangelho deste Domingo, João 20,1-9. O evangelho
indicado para este domingo tem como protagonista três personagens muito
próximos de Deus em humanidade: Maria Madalena, Simão Pedro e o discípulo amado,
João. Isso mostra que a fé na
ressurreição é uma experiência profundamente humana. Quem faz esta experiência
muda radicalmente sua vida e se abre para celebrar com Jesus a sua Páscoa. O
evangelho de João descreve o jeito como cada personagem reage diante da
ressurreição, da Páscoa. São atitudes
muito diferentes destes três personagens, porém, todas movidas para o encontro
com Jesus.
Maria Madalena reage de forma
precipitada: ao ver que a pedra tinha sido retirada da entrada do túmulo logo
conclui que alguém tinha levado o corpo de Jesus; a ressurreição nem sequer
passa pela sua cabeça.
Simão Pedro atua como um inspetor de
polícia diligente: corre ao sepulcro e não se limita, como Maria, a ver a pedra
removida; entra, observa as faixas de linho no chão e o sudário enrolado, num
lugar à parte. Algo muito estranho. Mas não tira nenhuma conclusão.
João, o discípulo amado também corre,
inclusive mais que Simão Pedro; mas quando chega ao sepulcro, espera
pacientemente. E vê a mesma coisa que Pedro, mas conclui que Jesus ressuscitou.
O evangelho de João oferece hoje uma
mensagem esplêndida: diante da Páscoa da Ressurreição de Jesus podemos pensar
que é uma fraude como pensou Maria Madalena, chegando a suspeitar que haviam
roubado o corpo de Jesus; como Simão Pedro não sabia o que pensar diante do
acontecido ou dar o salto misterioso da
fé e acreditar que Jesus ressuscitou dentre os motos como o fez João, o discípulo
amado.
O Evangelho de hoje nos apresenta um
progressivo caminho de fé. Começa com Maria Madalena que busca Jesus, sai de
seu esconderijo, vai ao encontro de Jesus, mesmo sabendo que ele havia sido
morto. Ela é levada pela coragem de buscar um sentido para sua dor e tristeza,
para sua vida. Ela sai de madrugada, no escuro, sem medo e sem pavor, porque
ela não sabe mais viver sem Jesus. Trata-se de um primeiro passo, o passo
fundamental para a Páscoa, o colocar-se em movimento, a caminho, sair, romper
com seus temores, seu mundo particular, seu lugar estreito e ir ao encontro do
outro. E Jesus a ordena: “Vá e confirme os Apóstolos na fé”.
A atitude de Pedro é bem parecida como o
de Maria Madalena. Ele também sai à procura e vai ao encontro de Jesus. Aqui
merece uma reflexão sobre este episódio. Conta-se que Pedro foi de madrugada às
escondidas ver o desfecho final da morte de Jesus. De repente, Jesus veio ao
seu encontro. Pedro, envergonhado por tê-lo negado por três vezes, corre desesperado,
mas Jesus o alcança. Volte aqui Pedro, falou Jesus. Não voltarei, sentenciou
Pedro. Eu fui infiel ao Senhor, eu fracassei, pois o Senhor me escolheu para eu
dar testemunho de minha fidelidade ao Senhor e eu não consegui. Jesus lhe
disse: não Pedro, eu não o escolhi para testemunhar sua fidelidade por mim. Eu
o escolhi para testemunhar a fidelidade do meu amor por você e em você pela
minha Igreja. Nisso não fracassei, pois eu fui fiel até o fim. Volte e assume
sua missão, pegue sua cruz outra vez.
Voltando ao relato do Evangelho de hoje
percebemos que João foi capaz de dar o salto da fé e mergulhar no mistério da
Páscoa da Ressurreição. Ele deixa-se tocar pelos sinais, não buscando razões
que expliquem o que tinha acontecido. Assume a atitude de acolhida do mistério.
Seu olhar é um olhar contemplativo que vai além dos sinais.
Os três viram os mesmos sinais; João,
com um olhar contemplativo, vai além das aparências. É preciso ter os olhos
destravados para “ler” os sinais da Ressurreição. João fica assombrado diante
de tantos sinais; ele “entra” no túmulo de maneira diferente; não faz de maneira
apressada, como Pedro. Ele para, observa, dá um tempo, tem paciência. Tem uma
atitude de acolhida e não de investigação. A razão ainda não é suficiente para
mergulhar no mistério da fé.
Certamente os três personagens ficaram
muito confusos diante do sudário dobrado, colocado à parte: “como é possível, alguém, no momento glorioso de sua vida, encontrar tempo para
dobrar um sudário!”. Este é um grande gesto de ternura de Jesus. É muito
cuidado com as coisas mais simples no momento mais importante.
Os relatos dos próximos dias de Páscoa
nos ajudarão a alcançar a terceira atitude. Qual atitude prevalece em mim?
“No
primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao túmulo de Jesus, bem de
madrugada,...”
No relato do evangelho de hoje, a
ressurreição é apresentada como uma “nova Criação” levada a termo pela
intervenção providente de Deus. É para isso que Jesus veio, para fazer uma nova
criação. A Páscoa da Ressurreição de Jesus é o primeiro dia desta nova criação,
o primeiro dia da nova semana. Agora tudo mudou, tudo é novo, nasceu também um
novo ser humano, o novo Adão.
A Páscoa faz tudo novo, renova tudo no
coração humano que faz a experiência desse Deus vivo que renova a face da terra
em Jesus Cristo ressuscitado e cria um “novo céu e uma nova terra”.
Tudo é Vida, é Páscoa, é
ressurreição. E quem faz esta
experiência vive desde já coo uma pessoa ressuscitada.
A Vida não a possuímos, ela é que nos
possui e nos invade, levando-nos e empurrando-nos para além de nós mesmo, para
frente e para o alto, abrindo-nos ao Absoluto.
Agora vale a Vida, agora é a Páscoa, a Ressurreição.
Estejamos atentos e conectados com a Fonte da Vida e com a toda a comunidade de
vida que nos envolve, pois a Páscoa da Ressurreição de Cristo atinge a toda
criação, como conforme o pensamento do apóstolo Paulo ao afirmar que a própria criação
sofre as dores da paixão de Cristo na história, aguardando a manifestação dos
filhos de Deus para que também el seja libertada e participe da Páscoa de sua
Ressurreição (cf Rom 8, 19 ss).
Estar atento aos sinais dos tempos é uma
das condições para vivermos a Páscoa da Ressurreição com Jesus, em Jesus e por
Jesus. Isso é viver ressuscitado.
Mas, para poder ver discernir o
significado dos sinais dos tempos, das “faixas”, requer-se atenção. Uma atenção
que nos faz estar no momento presente e calar o falatório mental. Nesse
Silêncio, poderá desvelar-se diante de nossos olhos a Presença que nos chama
pelo nome.
Maria Madalena madruga para encontrar-se
com a morte na sepultura; e Deus madruga mais ainda para recuperar a vida.
Madalena madruga para a morte e Deus madruga para a vida.
Enquanto estamos a caminho da morte,
Deus está a caminho da vida; enquanto continuamos presos no passado, Deus já
está no presente novo; nós visitamos sepulcros e Deus visita corações que vivem
e tem garra de viver; nós nos empenhamos em encher os sepulcros, e Deus se
encarrega de esvaziá-los.
Os sepulcros não são lugares de encontro
com Ele; a Ele o encontramos na comunidade reunida no amor. A verdadeira Páscoa
não acontece ao lado do sepulcro; ela acontece quando os corações começam a
pulsar de novo com um novo ritmo de vida e de esperança.
É Pascoa não só quando Deus ressuscita
Jesus de entre os mortos, mas quando Deus se faz acontecimento de vida em nós.
Deus celebra a Páscoa não junto à pedra do sepulcro, mas na vida das pessoas. É de madrugada, mas Deus já faz resplandecer
a luz da madrugada, esperando iluminar as mentes e despertar os corações para
acolher a Vida.
É madrugada, levanta povo!
A luz do dia vai nascer de novo.
Rompe as cadeias, abre o coração,
vamos dar as mãos, já é reino do povo.
O povo agora é senhor da história,
somos rebento desta nova era.
A liberdade, a fraternidade
são as bandeiras dessa nova terra.
Terra regada com sangue, com pranto;
história marcada de sonhos e desencantos.
Sementes plantadas pelas mãos do Senhor do mundo,
brotando a justiça, rompendo as cercas do
latifúndio.
Me corre nas veias as dores da humanidade,
mas brilha em meu peito a estrela da liberdade.
Levanta meu povo, Jesus é o Senhor da história!
Meu canto é reflexo do sol dessa nova aurora.
(Manelão)
Texto
bíblico: Jo 20,1-9
Na oração: A Luz da Páscoa da Ressurreição
desperta em nós o desejo de outra luz, de outra beleza. A tensão de luz e
sombra também está viva em nosso interior, no espaço interior de cada um de
nós. Somos filhos da luz e do dia, pertencemos ao dia e à luz. Ninguém pode
apagar esta luz nova que busca expressar-se no cotidiano de nossa vida. Em sua
tensão de luz e obscuridade contemple o a Páscoa do Ressuscitado.