Lucimar Moreira Bueno(Lucia) - www.lucimarbueno.blogspot.com

quinta-feira, 19 de março de 2009

O HINO A SER CANTADO SEMPRE

O Documento de Aparecida afirma: “A vida social em convivência harmônica e pacífica está se deteriorando gravemente (...) pelo crescimento da violência, que se manifesta em roubos, assaltos, sequestros e, o que é mais grave, em assassinatos que cada dia destroem mais vidas humanas e enchem de dor as famílias e a sociedade inteira”(DA 78).

O Documento, porém, não registra apenas as desgraças do mundo em que vivemos, mas nos ensina o caminho como devemos enfrentar essa dura realidade: “A radicalidade da violência só se resolve com a radicalidade do amor redentor”. Evangelizar sobre o amor de plena doação, como solução ao conflito, deve ser o eixo cultural “radical” de uma nova sociedade. Só assim o Continente da esperança pode chegar a tornar-se verdadeiramente o Continente do amor”(DA 543).

No dia 24 de setembro de 1978, quatro dias antes da partida inesperada ao paraíso do Papa João Paulo I, na emocionante “hora do ângelus” feito da janela papal aos domingos, ele narra a história das dezesseis carmelitas do Mosteiro da Encarnação de Campiége, na França, que em 1794 foram condenadas à morte “por fanatismo”.

Uma das Irmãs pergunta ao Juiz: “Por favor, o que quer dizer fanatismo? Responde o Juiz: É pertencerdes totalmente à religião”. “Ó irmãs”! Exclama então a religiosa,” ouvistes, condenam-nos pelo nosso apego a fé. Que felicidade morrer por Jesus Cristo!”. Na carreta que as levava ao cadafalso cantam hinos religiosos. Chegando ao palco da guilhotina, uma atrás da outra ajoelham diante da Priora e renova seus votos. Depois entoam o hino ao Espírito Santo “Veni Creator”.

O canto se torna cada vez mais débil, à medida que caem uma a uma, na guilhotina, as cabeças das pobres irmãs. Ficou para o fim, a Priora, Irmã Tereza de Santo Agostinho. Antes de ser executada exclama: “O amor sempre vencerá, o amor tudo pode”. E o Papa João Paulo I acrescenta: “Eis a palavra exata: não é a violência que tudo pode, é o amor que tudo pode!” Foram as últimas palavras do Papa “sorriso de Deus”, dirigidas naquela oração.

No dia 14 de março do ano passado, faleceu Chiara Lubich, sem dúvida uma das figuras femininas mais expressivas das últimas décadas. Não só o Papa, mas também representantes de outras religiões, políticos e artistas enaltecem essa mulher extraordinária. O cenário em que Chiara Lubich ouviu o chamado de Deus é a cidade de Trento, Itália, destruída pelo mais violento bombardeio que sofreu em 13 de maio de 1944.

Entre os escombros, ela abraça uma mulher enlouquecida pela dor. Uma mãe brada todo o desespero causado pela morte de seus quatro filhos. Neste contexto de extrema aflição, Chiara Lubich, estreitando nos seus braços mais uma “Raquel que chora seus filhos, e não quer ser consolada, pois não existem mais”(MT 2,18), se sente chamada a abraçar os sofrimentos da humanidade e descobre que a mais poderosa revolução, capaz de incendiar tudo com um só fogo, é o amor.

Na primeira Encíclica do Papa Bento XVI, “Deus é Amor”, afirma que Paulo apóstolo, na sua primeira carta aos Coríntios no capítulo 13, canta um verdadeiro hino, que de ser a “Magna Carta” para toda a humanidade. Diz o Papa: “São Paulo ensina-nos que a caridade é sempre algo mais do que mera atividade. A ação prática resulta insuficiente e não for palpável nela o amor pelo ser humano, um amor que se nutre do encontro com Cristo”.

Bento XVI insiste ainda que o amor não se deve restringir a dar ao próximo alguma coisa, o amor é muito mais: trata-se de um dar-se a si mesmo, de “estar presente no dom como pessoa” (Encíclica Deus é Amor n.34). Neste mundo sedento de segurança e de paz, quem sabe somente quando formos capazes de cantar com a vida este hino, poderemos construir um mundo melhor.

*Dom Anuar Battisti é arcebispo de Maringá-PR.