Pe. Alfredo J. Gonçalves
Há muito não se via um processo eleitoral tão despolitizado. Uma certa indiferença parece ter tomado conta das eleições municipais de 2008. Indiferença não apenas por parte do eleitor comum, o que costuma ser normal. Desta vez a indiferença contaminou os próprios militantes, os agentes intermediários.
Chegou a dar saudades do tempo em que a semana que precedia o pleito, e sobretudo o dia da eleição, envolvia centenas de voluntários, acirrava debates, erguia uma floresta de bandeiras de todas as cores. Nas proximidades da urna, disputava-se voto a voto, palmo a palmo, eleitor a eleitor. Entre discursos, carreatas e comícios, tudo ganhava um ar de festa. Uma festa que tinha um caráter cívico e participativo. Votar ou trabalhar nas eleições era como colocar um tijolo nessa imensa construção chamada Brasil.
É certo que as leis se tornaram mais rígidas, os tribunais eleitorais proibiram exageros, manifestações acintosas. Mas isso, por si só, não explica a apatia das eleições passadas. Há algo mais a ser investigado. É necessário mergulhar mais fundo na alma popular para entender esse tom de descrédito e desencanto que marcaram claramente as últimas eleições. No fundo, é como que toda essa parafernália de propaganda gratuita, de urnas e de apurações pouco ou nada tivesse a ver com o cotidiano da população.
Criam-se dois campos separados, duas órbitas circulando em direções paralelas, quase como dois planetas. Enquanto, por um lado, a população permanece na sua luta diária pelo emprego, pelo pão, pelo pagamento das taxas de água, luz, aluguel, disputando espaço nos transportes públicos, amargando nas filas do INSS, por outro, uma classe de seres meio extraterrestres, gasta fábulas de dinheiro para conquistar uma cadeira no céu da política ou para perpetuar-se nela.
Ambos os campos até se aproximam nas vésperas das eleições, trocam cumprimentos e favores. Mas depois, salvo raras exceções, cada um caminha em direções opostas. A população sente-se tão longe dos políticos quanto estes dela. A política reduziu-se a isso: ir até a urna, digitar o número de algum candidato e voltar para casa. Daí para frente só resta esperar que ele faça alguma coisa.
Há um desafio a enfrentar: passar dessa democracia representativa a uma forma mais participativa. Criar canais de pressão e de cobrança por parte do povo. Estabelecer mecanismos e instrumentos de controle popular, seja do orçamento público, seja das ações e comportamentos públicos dos eleitos.
Lucimar Moreira Bueno(Lucia) - www.lucimarbueno.blogspot.com