Lucimar Moreira Bueno(Lucia) - www.lucimarbueno.blogspot.com

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Favela é área fértil para perversão política, diz sociólogo

ANTÔNIO GOIS
da Folha de S.Paulo, no Rio

Favelas são terreno fértil para formas perversas de política, diz o sociólogo Luiz Antonio Machado Silva, que há 40 anos estuda favelas no Rio. Machado Silva vê algo de novo e preocupante nas notícias sobre a presença cada vez maior de grupos criminosos com representantes no Poder Legislativo e impedindo a participação de outros políticos em suas áreas de atuação.

Como exemplos de "formas perversas de política", ele cita a troca de votos pelo acesso a bicas d'água, prática comum na década de 40. Lembra também que não é novidade a tentativa de interferência na política, mas que, dessa vez, ela começa a ocorrer!sem intermediários" e com intimidação a políticos que tentam atuar na mesma área.

"Os moradores de favelas acabam confinados e estigmatizados, com dificuldades enormes de organizar suas demandas coletivas. De um lado, a articulação é dificultada pelo tráfico ou pela milícia, e, de outro, há uma polícia com delegação das camadas mais abastadas para reprimir."

Machado Silva, autor do livro "Crime Violento e Política no Rio de Janeiro", é doutor pela Rutgers University, pós-doutorado pela Universidade de Lisboa e professor do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro).

As favelas estão virando currais eleitorais?
Luiz Antonio Machado Silva - Num certo sentido, elas sempre foram por estarem à margem da sociedade, o que cria um terreno fértil para todas as formas perversas de política. Mas foram raros os momentos em que isso chegou ao ponto do confinamento por meio da violência. Lembro do caso do Tenório Cavalcanti [deputado morto em 1987 que fez carreira política na Baixada Fluminense e inspirou o filme "O Homem da Capa Preta", mas jamais com a intensidade de hoje.

Também não é novidade a tentativa dessas organizações ilícitas de defender seus interesses politicamente. Mas isso acontecia principalmente por meio do financiamento ilegal a alguns candidatos. O jogo do bicho é um exemplo claro disso e, quando ele começa a perder força, o tráfico faz o mesmo.

Agora, no entanto, isso vem se modificando porque alguns grupos ilegais, além de usarem intensamente a violência, estão escolhendo seus próprios candidatos para entrarem na política e defenderem seus interesses. Não há mais intermediários.

Isso surge por causa da ausência do Estado?
Machado Silva - Não acredito. O que há é uma diferenciação entre a atuação do Estado nas favelas e nas áreas mais abastadas. O Estado está presente, seja por meio de escolas ou postos de saúde, seja pela atuação da polícia. A atuação não é homogênea. A polícia não barbariza no Leblon, mas barbariza nas favelas. O problema não é a ausência.

Disso resulta que os moradores de favelas acabam confinados e estigmatizados, com dificuldades enormes de organizar suas demandas coletivas. De um lado, a articulação é dificultada pelo tráfico ou pela milícia, e, de outro, há uma polícia com delegação das camadas mais abastadas para reprimir. Essa população fica, com isso, cercada pelos dois lados.