Moradias de paredes e tetos de madeirites, montados como quebra-cabeças, que deixam alguma abertura para o frio outonal de Bueno Aires. Piso de terra, como as ruas que ao redor e que, geralmente, embarreia toda vez que chove, dificultando os acessos. Longa caminhada para se chegar ao ponto de ônibus. Uma latinha que serve para cozinhar ou esquentar o mate e lenha para aquecer o ambiente. Ligação elétrica clandestina. Uma sala de estar e um dormitório com uma cama de casal onde, também, dormem alguns filhos. Além de um banheiro, a poucos metros, feito de plásticos com um buraco para fazer as necessidades básicas. São assim algumas das moradias precárias nos arredores da capital argentina, um drama que afeta toda a América Latina, apesar da última década de crescimento econômico e melhora da equidade.
A reportagem é de Alejandro Rebossio, publicada no jornal El País, 15-05-2012. A tradução é do Cepat.
Para 2015, o crescimento econômico da região ajudará apenas 36% das famílias que, no momento atual, vivem em moradias precárias. Os programas públicos de moradias provavelmente ajudarão outros 5%. Com estas projeções, dentro de três anos, cerca de 36% das famílias das áreas urbanas e rurais continuarão vivendo em moradias inadequadas, diante dos 37%, em 2009. O banco adverte que a proporção é maior que em outras regiões do mundo, com níveis de rendimentos semelhantes.
Quase dois milhões, dos três milhões de famílias que se constituem a cada ano em cidades latino-americanas, são obrigadas a instalar-se em moradias informais, como nas áreas marginais, segundo relatório elaborado pelo BID a partir de dados oficiais de 18 países da região. A maioria da população, que vive nas principais cidades, carece de suficientes meios econômicos ou não pode aderir a um crédito hipotecário para moradias mais econômicas, oferecidas pelo setor privado. Mais da metade das famílias de Caracas, La Paz, Bueno Aires, São Paulo, Rio de Janeiro, Cidade do México, Quito e Manágua não podem pagar mais do que uma moradia construída por conta própria.
O BID considera que os projetos de moradias sociais, dos governos latino-americanos, deveriam setuplicar-se para satisfazer a demanda. Além disso, adverte que estes programas muitas vezes não favorecem aos mais pobres. “Estes planos começam a ajudar as famílias quando já estão instaladas em terrenos baldios, sem estrutura básica e nem planejamento”, destaca o coordenador do estudo, César Bouillon, em conversa por telefone, de Washington. A urbanização de terrenos, antes de serem ocupados, custa 1.299 euros por família, comparado aos 3.438 euros que custa a melhoria de uma ocupação constituída. Segundo Bouillon, outros problemas enraízam-se na falta de acesso aos títulos de propriedade e na tendência em se desenvolver moradias sociais na periferia ao invés de se recuperar as áreas centrais. Por sua vez, a população tende a construir suas moradias com ladrilho ou cimento, apesar dos materiais estarem mais caros nos últimos anos.
Segundo Bouillon, a ausência de crédito para a classe média baixa constitui outro obstáculo. Muitos trabalhadores não podem justificar seus rendimentos para o banco porque estão empregados informalmente. Acontece, também, de “muitos municípios terem regulações do planejamento da terra, pensados para bairros de classe média ou alta”, segundo Bouillon. Em Bueno Aires, a moradia mais barata custa 34.460 euros ou 45 meses de trabalho assalariado médio, o que contrasta com Bogotá, em que por 9.575 euros se consegue uma, ou seja, com dez meses de renda, segundo o BID.