Lucimar Moreira Bueno(Lucia) - www.lucimarbueno.blogspot.com

quinta-feira, 5 de março de 2009

Em nota, Luiz Couto se diz surpreso com a decisão de Dom Aldo Pagotto

Ao povo paraibano,
Meus irmãos e irmãs,

No início da Quaresma e na abertura da Campanha da Fraternidade de 2009, fui pego de surpresa por minha suspensão das atividades de sacerdote desta querida Arquidiocese. Estranhei que a decisão da suspensão do exercício ministerial fosse dada sumariamente e publicizada na imprensa local antes que eu fosse previamente ouvido; pois, já estava certo de que no dia seguinte, eu iria encontrar-me com o Sr. Arcebispo. Somente no dia 26/02/2009, às 16:20h, recebi o comunicado oficial da Arquidiocese. Assim sendo, venho prestar alguns esclarecimentos.
Sou padre desta Igreja particular desde 1976 e venho me dedicando ao meu ministério sacerdotal com muito empenho, assumindo diversas atividades, como pároco, professor e hoje Deputado Federal. Nunca tive dúvida de que minha opção de vida foi o sacerdócio que é vivido em muitas frentes. Tenho a graça de ser representante do povo paraibano, quando coloquei meu nome à disposição do Partido dos Trabalhadores pleiteando um mandado parlamentar. Fui eleito Deputado Estadual por duas vezes e Federal por duas legislaturas. O que é mais gratificante é o serviço que posso prestar ao povo brasileiro, em especial do meu Estado.
A minha ordenação me configurou à pessoa de Jesus Cristo. A sua causa é a minha causa. Por isso, não temo as ameaças que me fazem. Se sou uma pessoa marcada para morrer, é porque como padre e deputado não posso calar-me diante das injustiças e da violação dos Direitos Humanos. O que me dá forças para continuar denunciando as arbitrariedades, é o Evangelho, é o chamado de Jesus para segui-lo em defesa dos excluídos da sociedade.
A minha suspensão das atividades sacerdotais foi devida a entrevista que saiu na revista eletrônica Congresso em Foco no dia 14 de fevereiro e reproduzida pelo jornal “O Norte” em 26/02/2009. O que está contido na entrevista já é debatido no seio da Igreja. Digo-lhes com sinceridade que não esperava por tal punição que me impede de celebrar a Eucaristia que é o Oxigênio e motivação existencial do meu 'Munus Sacerdotal' na comunhão com Deus com a Igreja e com o povo. Alguns pontos da entrevista merecem algumas considerações que fiz e que estão ausentes no referido jornal, e que agora tenho a oportunidade de esclarecê-los.
Primeiro: O celibato é um valor na vida da Igreja. Muitos celibatários vivem uma vida exemplar e inspiradora. Portanto, não é o celibato que questiono, mas sua obrigatoriedade. Quando o celibato é imposto e obrigado pode trazer sofrimentos humanos desnecessários. O celibato aceito como carisma é abençoado e o celibato obrigatório e imposto pode se tornar um martírio silencioso. Esse tema já foi bastante discutido na Igreja e continua sendo. Recentemente, o bispo Dom Clemente Isnard falou sobre o assunto num livro intitulado: “Reflexões de um bispo” . E o teólogo americano Donald Cozzens, lançou o livro: “Liberar o Celibato”. Entretanto, o que digo na entrevista não desvaloriza a disciplina do celibato.
Segundo: No que diz respeito aos homossexuais, temos que amá-los como irmãos. Hoje devido à homofobia que é crescente, se impõe, como nunca, o espírito de tolerância. Caso contrário, assistimos a esgarçamentos do tecido da sociedade civil com conseqüências funestas para o convívio e para o respeito necessários. Como padre e Deputado, luto pela tolerância e contra a discriminação entre os diferentes. Ninguém pode ser alijado dos seus direitos por ser homossexual. Jesus de Nazaré mostrou que o respeito à dignidade humana é o remédio para combater a intolerância e a discriminação.
“Qualquer forma de discriminação nos direitos fundamentais da pessoa, seja ela social ou cultural, ou que se fundamente no sexo, na raça, na cor, condição social, língua ou religião deve ser superada e eliminada, porque é contrária ao plano de Deus”. (GS 29). Jesus na sua pedagogia acolhia a todos, pouco importava quem eram seus ouvintes, bastava que tivessem os ouvidos bem abertos para acolher sua palavra e o coração aberto para iniciar o caminho de adesão ao Reino. Os homossexuais nessa sociedade homofóbica são silenciados. Só se liberta dos preconceitos quem é capaz de restituir a palavra aos silenciados. A tolerância para com os homossexuais é antes de mais nada uma exigência ética. Ela representa o direito que deve ser reconhecido a cada pessoa .
Terceiro: A epidemia de AIDS é uma realidade que desafia a Igreja na sua moral. A moral é uma realidade prática que tem conseqüências. Nos confrontamos constantemente entre a Moral Ideal pregada pela Igreja e a realidade. O ideal da moral da Igreja deve ser vista como metas para onde se orientar. Nessa perspectiva, ninguém se sente culpabilizado ou desobediente por não realizar o proposto, mas sabe para onde se dirigir. O ideal seria que ninguém se contaminasse com a AIDS, mas a realidade é outra. Devido ao número crescente de pessoas vítimas de doenças sexualmente transmissíveis, o preservativo entra como uma questão de saúde pública, como é o caso da gravidez na adolescência. Lembro-me de uma entrevista que o Cardeal Arns disse nos anos noventa que o preservativo era um mal menor. No entanto o cardeal, em nenhum momento desrespeitou a doutrina da Igreja.
Como padre aprendi que o Bispo é o pastor da Igreja, por isso jurei no dia da minha ordenação, obediência ao meu bispo, porém, quero frisar que a obediência no seu sentido teológico envolve a capacidade de dialogar sem submissão. Como lembra Dom Tomás Balduíno “a autoridade da Igreja tem mil caminhos para dialogar com o sacerdote”
Que o Deus da misericórdia, da ternura, da bondade e do amor me conceda, nesta Quaresma, a serenidade das Bem-aventuranças para que eu possa enfrentar esse meu sofrimento, que me levará à alegria da Páscoa.

João Pessoa PB, 29/02/2009
LUIZ ALBUQUERQUE COUTO
Sacerdote e Dep. Federal.