Lucimar Moreira Bueno(Lucia) - www.lucimarbueno.blogspot.com

sábado, 30 de julho de 2011

Carta final do 9º Encontro Estadual das CEBs

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9º Encontro Estadual das CEBs

Bispos, padres, religiosos(as), diáconos, seminaristas e

aspirantes a vida religiosa

No Vale da Ribeira, estivemos reunidos nos dias 26 e 27 de julho, na Diocese de Registro, na cidade de Eldorado. Éramos 33 participantes dos Subs: Botucatu, Campinas, Sorocaba, SP2, RP1. Fomos muito bem acolhidos pelas Comunidades da Paróquia Nossa Senhora da Guia e destacamos a acolhida das famílias que nos receberam em suas casas.

Iniciamos o encontro com uma oração fazendo memória dos encontros anteriores que nos motivou para a assessoria do 9º Encontro. Nos alegrou com sua presença, almoçando conosco o bispo Dom José Luis Bertanha e outros padres desta Diocese.

No primeiro momento o assessor Pe. Paulo Parise nos ajudou a refletir, sobre a Cristologia na ótica das CEBs, a partir das 5 Conferências do Episcopado da America Latina e Caribe. Ele nos ajudou a compreender os elementos cristológicos e a visão geral de cada Conferência.

Na Conferencia do Rio de Janeiro, temos poucos traços cristológicos, domina a cristologia do alto, ou seja, há uma ausência do Jesus humano. A linguagem é apologética e com enfoque eclesiocentrico. Já em Medellin, no contexto das ditaduras latino americanas, temos o nascimento dos movimentos revolucionários e a Igreja volta seu olhar para a promoção humana (justiça, paz, família, educação e juventude). Temos alguns eixos cristológicos, o rosto de cristo é visível nos pobres. Cristo pobre e compromisso com os pobres, a redenção em Cristo como libertação. Em Puebla, cresce a importância cristológica, Cristo aparece de maneira plural, junto com a eclesiologia e a antropologia. Há uma expansão da Teologia da Libertação, apesar de reações conservadoras ao Vaticano II e à Medelin. Igreja missionária ao serviço da evangelização, Comunhão e participação, opção preferencial pelos pobres e jovens. Em Santo Domingo, temos a mudança de regimes, de militares a democráticos, exclusão social, miséria, inflação. Do ponto de vista eclesial, temos os 500 anos de evangelização, ações para frear a teologia da libertação e uma expansão neo-pentecostal. A estrutura do documento é eclesiocentrica, a nova evangelização tem um anuncio querigmático, acentuando a divindade de Jesus. Em Aparecida, temos uma co-existência de complexas realidades: globalização, cultura da imagem, exclusão, miséria e injustiças, afirmação do lucro como valor supremo, destruição de ecossistema e Forte emigração. Do ponto de vista eclesial, constatamos o crescimento dos que acreditam em Deus mas se declaram sem religião, a afirmação dos movimentos católicos. A estrutura é centrada em Jesus Cristo e no tema da vida. É a cristologia do encontro, do discípulo-missionário, da alegria, da beleza, cristologia trinitária e pneumática. Destaque na fala do Papa Bento XVI: a opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica.

Em grupo refletimos o que foi trabalhado das conferencias, suas conquistas e desafios, percebemos, mesmo diante de tantos obstáculos apresentados, é preciso partilhar as pequenas sementes existentes, de ações concretas vividas em nossas comunidades e procurar somar as forças. Destacou-se nos grupos que as partilhas enriquecem e fortalecem a caminhada. Precisamos cada momento descobrir a presença e o rosto de Cristo na face das pessoas, da mulher, dos quilombolas, dos pobres, dos indígenas. O assessor conclui este momento mostrando as diferentes óticas trabalhadas nos grupos, abordando o grande desafio de hoje, na pós-modernidade, onde não há um elemento real para atingir, combater, como na época dos profetas eram os reis. Mas todos devemos nos colocar numa perspectiva de aprendizagem.

O assessor a partir do livro de Jon Sobrino, nos ajudou a aprofundar a visão de Jesus e do Reino de Deus. O primeiro eixo é: Jesus viveu centrado no Deus do Reino (Os evangelhos não deixam dúvidas sobre a centralidade de Deus na vida de Jesus). Jesus herdou as noções e experiência de Deus a partir da: tradição profética, apocalíptica, sapiencial e existencial. Jesus percebeu que para Deus nada é mais importante que o ser humano, nada pode ser usado contra o ser humano, nem o serviço a Deus. O segundo eixo é: Jesus viveu centrado no Reino de Deus. A realidade última para Jesus não foi ele mesmo, mas tampouco Deus fora da história. A realidade última foi o reino de Deus. Jesus se dirige em primeiro lugar aos pobres, os primeiros destinatários do reino de Deus. Jesus herdeiro de uma concepção que amadureceu na história de seu povo. É a atuação de Deus na história para transformar uma realidade má em boa e justa. É uma incidência real na história dos homens e mulheres. Visa à transformação real de toda a comunidade, não só do indivíduo. É boa notícia no meio de más notícias.

No segundo dia tivemos a apresentação da realidade quilombola e ribeirinha, feita pelo Irmão Ivo e pela Irmã Ângela e outros que trabalham nessas comunidades com o projeto chamado EAACONE (Equipe de Articulação e Assessoria das Comunidades Negras). No vale do Ribeira tem cerca de 60 comunidades quilombolas. As principais dificuldades enfrentadas é o reconhecimento das terras. Esta equipe trabalha na formação, com os estatutos, o reconhecimento, a demarcação, as questões jurídicas. Além das lutas por infra-estrutura para se viver da/na terra.

Orientados pelo Pe Gilberto de França (atualmente Vigário da Paróquia N. Sra. Da Conceição da cidade de Jacupiranga, SP) que nasceu, cresceu e viveu na Comunidade Quilombola de São Pedro da cidade de Eldorado, SP, distante a 60 km e atualmente tem 48 famílias, com 152 pessoas. Fizemos uma experiência concreta de Cristologia na Ótica das CEBs. Os Quilombolas ficaram muito felizes, bem antes de o encontro acontecer, porque iríamos visitá-los e se preparam com antecedência, para nos receber, com o melhor do que tinham para oferecer.

A viagem para o Quilombo foi um momento de sentir Deus na natureza, nos rios, nas matas, nas pessoas, no fazer a travessia pela balsa. Na estrada demos um abraço numa árvore grande e centenária, simbolizando nosso compromisso na defesa do meio ambiente e destes povos sofridos.

A acolhida da Comunidade foi uma festa, grande alegria em todos os momentos e na chegada, com fogos de artifício, fomos recebidos por toda a Comunidade, crianças, jovens, adultos, mulheres e homens, ouvimos o maravilhoso canto de autoria da Dona Elvira Morato, destacamos o refrão: “//sejam bem vindo, senhor sejam bem vindo. Nós te acolhemos com muita emoção//. E uma estrofe: “Nós do São Pedro, hoje estamos em festa. Foi Jesus Cristo que ajudou nós preparar. Com alegria, estamos recebendo nossos pastores que vem nos visitar”.

Na Igreja de São Pedro, todos e todas nos apresentamos e depois no salão comunitário, tivemos uma apresentação de capoeira do local e o Coordenador da Associação da Comunidade de São Pedro, o Jovem Gilberto e com a liderança do Sr. Aurico que nos acompanharam em todos os momentos, foi passado breves vídeos mostrando a rica história deste Quilombo, suas lutas, suas dores, conquistas e o maior desafio, ter o registro da terra, lugar onde seus antepassados chegaram e fundaram a Comunidade em 1.856. Na década de 80 aumentou o conflito com fazendeiros, foi assassinado um quilombola, Sr. Carlito, vítima de um fazendeiro que queria mais terra. Contudo, esta tragédia não abalou a Comunidade que se uniu e permaneceu. A Igreja neste período teve e tem um papel muito importante, em especial as Irmãs Pastorinhas Ângela e Aparecida, também o Irmão Ivo, Padres, leigos e leigas, ajudar este povo a ter fé e vida e seus direitos garantidos. Além da terra outro desafio é não deixar acontecer a construção de uma barragem hidrelétrica, afetando milhares de pessoas. Os Quilombolas não são contra o progresso, mas contra a maneira que se impõe, pois seria destruída grande parte da fauna e da flora, além de milhares de quilombolas, ribeirinhos e indígenas, engrossarem as estatísticas das favelas das grandes cidades. Desenvolvimento sim, desde que seja sustentável e vida digna para todos, especialmente os mais pobres.

Outro momento marcante foi a refeição (o café e o almoço) com produtos dos quilombos, produtos naturais, saborosos e especiais (a mandioca, a farinha, a batata, a banana, o cará, o milho, a pupunha, a cana, o arroz, o feijão, legumes e verduras, galinhas etc). Conhecemos algumas ações Comunitárias, destacamos, a horta com produtos orgânicos.

Depois, partilhamos as experiências desta Cristologia vivida por todos/as, destacamos: volta às nossas raízes, a alegria, a acolhida, a partilha, a gratuidade, a fé, a presença de Jesus Cristo, a união, a resistência, a luta pelo registro da terra, projetos para que neste local tenham vida digna: estrutura para uma cultura de alimento sustentável, saúde, educação, moradia, transporte, ou seja, qualidade de vida e paz respeitando o meio ambiente.

Encerramos com uma Missa Afro, celebrada pelos Padres quilombolas Pe Gilberto (nascido e criado nesta Comunidade de São Pedro) e Pe Joca (criado na Comunidade Quilombola de Porto Velho e Ordenado Presbítero neste Quilombo) junto com toda a Comunidade expressamos nossa gratidão a Deus pela experiência deste dia, toda essa convivência é muito sagrada (é uma Eucaristia), é uma experiência que marcou e marcará as nossas vidas, nossa amizade e o compromisso com a luta deste povo.

Eldorado, 27 de julho de 2011

Participantes do 9º Encontro Estadual das CEBs

Bispos, padres, religiosos(as), diáconos,

seminaristas e aspirantes a vida religiosa