Lucimar Moreira Bueno(Lucia) - www.lucimarbueno.blogspot.com

terça-feira, 2 de junho de 2009

Laissez faire e mão invisível

Pe. Alfredo J. Gonçalves, CS

O escocês Adam Smith (1723-1790) é considerado o fundador da economia política. No contexto da crise mundial que estamos atravessando, convém retomar duas expressões do seu pensamento que fizeram história. Mais ainda, que cimentaram os alicerces do modo de produção capitalista.

A primeira refere-se ao laissez faire, expressão francesa que pode ser traduzida por liberdade total de produzir, vender e consumir. Trata-se do núcleo central do liberalismo econômico. No século XVIII, os economistas clássicos acreditavam piamente que esse era o motor da economia. O egoísmo pessoal de cada um contribuía para soluções que beneficiavam a todos.

O laissez faire comandou a expansão do capitalismo sobre os recursos da natureza e sobre a força humana. O colonialismo, as migrações em massa e a exploração do trabalho são versões negativas desse expansionismo. O mesmo princípio impôs a todo custo a idéia de crescimento ilimitado, fonte do lucro e da acumulação crescente. O capitalismo levado às últimas consequências conduz ao mercado total.

Resulta evidente que hoje essa filosofia liberal entra em rota de colisão com a preservação do meio ambiente, com o aquecimento global, com a escassez de fontes de energia, com a produção de alimentos. Isto sem falar do aprofundamento progressivo do abismo entre os países ricos e os países pobres. A palavra liberdade gerou um monstro chamado liberalismo econômico: colocar no mesmo ringue forças desiguais, historicamente, tende a fortalecer os grandes e enfraquecer os pequenos. Daí o pendulo freqüente dos deslocamentos humanos das regiões subdesenvolvidas para as regiões desenvolvidas do planeta.

O mais grave é que, atualmente, em plena crise financeira, econômica, ambiental, energética, climática, etc. – o que se propõe como solução? Qual o remédio a ser aplicado? O que propõem os governos, o agronegócio e as empresas multinacionais? Que medidas tomam os países, seja no centro ou na periferia? Como se esforçam esses atores sociais e econômicos para resolver a crise em curso?

Aqui entramos com a segunda expressão de Adam Smith: a mão invisível que, de forma mais ou menos automática, regula os excessos do mercado. De acordo com esse autor, a economia contava com uma espécie de mecanismo natural que entrava em ação frente aos extremos, impedindo o desenvolvimento de uma forma de capitalismo selvagem. Forças invisíveis regulavam a produção, a comercializaçã o e o consumo, de forma a buscar a humanização da economia de mercado.

Votando à crise atual, nos damos conta que a mão invisível nada tem de invisível. Trata-se, pura e simplesmente, do poder dos governantes de plantão. Poder que permanece inerte e oculto em tempos de lucros exorbitantes, mas mostra sua cara em tempos de vacas magras. E neste caso o efeito é contrário ao que pensava o economista escocês: a mão invisível mostra a cara não para regular os excessos da exploração e proteger os trabalhadores da selvageria natural da economia capitalista, e sim para fazê-los pagar os custos da crise. Enquanto os lucros são privatizados diante da cegueira das autoridades (mão invisível), os prejuízos são coletivizados e transferidos para as populações de baixa renda, sob a pressão dessas mesmas autoridades.

Busca-se a todo custo salvar o sistema financeiro, o agronegócio, as indústrias automobilísticas, as grandes redes de supermercados, etc., em detrimento das iniciativas de economia solidária, da agricultura familiar, da pequena e média empresa, da fixação do homem no campo, da preservação do emprego. Pior ainda é o remédio a ser receitado. Diante de uma economia enferma pelo conceito de crescimento ilimitado, a solução mágica é... mais crescimento, mas investimento, mais mercado! O remédio prenuncia a morte do doente.

Como pensar seriamente em reverter esse modelo de produtivismo consumista? Aí entra o conceito de nova civilização: mais frugal, sóbria, justa, solidária e sustentável. Harmônica com os recursos da natureza. Salvando a biodiversidade, numa convivência pacífica com outras formas de vida. E construindo um novo conceito de pátria, onde as fronteiras sejam os limites do globo terrestre.